A RESPEITO DA VIOLÊNCIA COLONIAL: REVERBERAÇÕES POLÍTICAS E HISTÓRICAS EM DUAS NARRATIVAS LITERÁRIAS AFRICANAS DE LÍNGUA PORTUGUESA

Alex França

Não há colonialismo que prescinda do exercício da violência. No colonialismo, a violência não é circunstancial, episódica, ela é essencial, sistêmica, racial, como bem apontou o filósofo e psiquiatra martinicano Frantz Fanon. Diante desse contexto, inúmeros escritores de terras colonizadas, em particular da África, interpretaram o sistema e trataram as sequelas desse processo de dominação em suas sociedades. Propomos, assim, uma análise e leitura interpretativa do tema a partir dos textos literários “O último pesadelo”, da escritora moçambicana Lília Momplé, presente no livro Ninguém matou Suhura, e “A fronteira de asfalto”, um dos que compõem o livro A cidade e a infância, do escritor angolano José Luandino Vieira, considerando o contexto histórico e social ao qual se inserem as obras, bem como a construção simbólica de suas principais personagens. Os cenários temporais dessas narrativas abarcam justamente o período histórico de segunda metade do século XX (precisamente entre os anos de 1950 e 1974), o qual circula um imaginário imperialista português pautado na homogeneidade territorial anacrônica, ao mesmo tempo que se desenvolve a luta nacionalista pela independência das suas antigas colônias africanas. Para tal, contaremos com as contribuições teórico-críticas de autores como Frantz Fanon, Aimé Césaire e Grada Kilomba. Ao expor questões colonialistas com tamanha criticidade, denunciando a violência e brutalidade dos confrontos pela emancipação nacional, através da literatura, Lília Momplé e José Luandino Vieira constroem um discurso narrativo que mantém fortes vínculos com a História, fazendo com que a literatura reflita dignamente aos conflitos e tensões políticas vividas por esses povos, assim como mobilizam as memórias sociais que oscilam entre passado e presente. Nesse sentido, os textos se mantêm bastante atuais no que tange à análise do que foi o contexto colonial e de como a repressão e violência coloniais foram exercidas desde então.