As ecologias da crise: ecocrítica da matéria e a distribuição de agência na obra de João Paulo Borges Coelho e Nuruddin Farah.

Marta Banasiak

No cerne do antropocentrismo moderno encontra-se o paradigma que assume a posição do ser humano como, nas palavras de Descartes, mestre e dono da natureza. Esse paradigma, que se verificou tanto como a raiz do paradigma da modernidade quanto o motor da expansão capitalista e industrial permitiu com que o homem explorasse e dominasse a natureza e os seus recursos até esta se encontrar hoje numa situação de colapso. No entanto, a convicção de que humano seja a única entidade possuidora de agência tem sido recentemente desafiada por várias correntes teóricas no âmbito de ciências sociais e humanas. Entre eles destaca-se a orientada pelos novos materialismos ecocrítica da matéria (Iovino, Opperman, 2014) sendo a sua ideia central a distribuição de agência que se manifesta como uma rede de iterações entre elementos humanos e não humanos, animados e não animados. O foco na rede de agências igualitárias orienta também outras propostas teóricas como a teoria de coletivos de Bruno Latour (1999) ou transcorporealidade de Stacy Alaimo (2010).
Partindo dessas premissas teóricas, na presente apresentação propõe-se uma leitura comparativa das obras do autor moçambicano, João Paulo Borges Coelho e do autor somali Nuruddin Farah. Pretende-se observar como estes autores, ao descreverem as crises contemporâneas, sejam elas, ambientais, militares ou humanitárias, apoiam-se na construção das redes de interações entre os elementos humanos e não humanos. Argumenta-se que essa distribuição da agência promove a mudança de paradigma de pensamento destacando a necessidade de descentralização da posição humana dentro da natureza como um ato fundamental para os movimentos ambientalistas.