Nesta comunicação, caracterizo como, durante o Estado Novo (1933-1974), o colonialismo português foi imaginado cinematograficamente pela propaganda da ditadura. Analiso sumariamente as representações impostas pelas actualidades e documentários de propaganda feitos por iniciativa estatal – como é que fixaram o proclamado “modo português de estar no mundo” – para, em contracampo, evidenciar olhares disruptivos em filmes proibidos – Catembe (Manuel Faria de Almeida, 1965) e Deixem-me ao menos Subir às Palmeiras… (Joaquim Lopes Barbosa, 1972). Quando emerge o Novo Cinema, quais as evidências da (im)possibilidade de constituir imaginários contestatários do memorial fílmico sedimentado pela propaganda? Se há temas e representações impostas e outras deixadas “fora de campo” pelo cinema de propaganda, de que modo é que isso também determinou também o cinema censurado? Não obstante, através de uma nova abordagem estética e sociológica, transversal ao Novo Cinema português, terem ido emergindo várias disrupturas nos filmes proibidos, persistiram certos modos de representação e de diferenciação social e de género. Apesar das rupturas do Novo Cinema, quais as persistências em termos de imaginário colonial? Entre as propostas de cinema descolonizador, integradas numa estética e ética do Terceiro Cinema, que se afirmou também a partir da Conferência Tricontinental que aconteceu em Havana, focarei os filmes e a poética de Sarah Maldoror, profundamente inspirada por Aimé Césaire, para sublinhar continuidades que ditaram a sua invisibilização como realizadora mesmo após as independências africanas.
Campo, contracampo do arquivo português e o fora de campo de Maldoror ( ou ingularidade de um cinema político)
Maria do Carmo Piçarra