“Existe uma literatura negra em Portugal?”, pergunta-se Bianca Mafra Gonçalves, em 2019. Agora, a cinco anos de distância, não cabem dúvidas. A resposta é sim, existe. A literatura negra em Portugal, isto é, a literatura escrita por pessoas negras e sobre pessoas negras, que vivem neste país de maioria branca, e que pertence potencialmente a mais de um contexto nacional, é ainda um fenómeno relativamente recente, mas o seu corpus crescente tem suscitado bastante interesse na última década por parte da academia e de uma fração do meio editorial.
É de conhecimento geral que os termos que classificam grupos de obras literárias podem ter efeitos negativos, ao tornarem-se rótulos limitadores, que criam nichos, ou, pior, guetos, que particularizam e separam algo que faz parte da sociedade no seu todo. No entanto, para podermos falar de um fenómeno da nossa realidade (seja ele literário, social ou de outra natureza) precisamos de palavras, mais concretamente, de termos técnicos, mesmo que o objetivo final seja ultrapassá-los, dissolvê-los, e, no caso concreto, libertar a literatura de rótulos.
Tendo isto em conta, pretendo, nesta comunicação, 1) caraterizar a “literatura negra” produzida em Portugal a partir do ano 2011, 2) fazer um levantamento dos termos que se tem usado para classificá-la e discutir a sua semântica e o seu alcance, e 3) avaliar criticamente qual é o termo mais indicado para falarmos deste segmento da literatura em Portugal na atualidade.
Literatura negra, literatura (de autoria) afrodescendente, literatura afro-migratória: uma reflexão terminológica no caso português
Doris Wieser