Em torno da escravidão e da liberdade no Moçambique colonial: contextos, práticas e limites

Na colónia portuguesa de Moçambique, que se estendia por locais litorâneos e pelo vale do rio Zambeze na África Oriental, o trabalho dos escravizados era fundamental para sustentar a economia, assegurar o funcionamento doméstico e afirmar o estatuto social dos senhores, assim como para defender militarmente a ordem imperial face a resistências internas e ameaças dos poderes africanos vizinhos. A escravização de milhares de pessoas estava embebida em práticas locais de dependência e clientelismo, as quais sofreram novas configurações no contexto colonial. Formas mais europeizadas de escravização coexistiam com práticas africanas, consoante a capacidade de negociação dos escravizados e dos senhores, a qual variava ao longo do território sob domínio português. Antes da abolição da escravatura no império português, em 1869, a possibilidade de os escravizados mudarem o seu estatuto para livres dependia da sua capacidade de acordarem com os senhores a manumissão, um mecanismo admitido pelo regime normativo português. Enquanto essa foi uma prática adoptada em todas as colónias portugueses, e em geral nos impérios europeus, em Moçambique, a manumissão teve uma expressão limitada.
Esta comunicação explora os significados da escravização e da alforria na colónia portuguesa de Moçambique, tendo como base fontes do arquivo colonial. Em primeiro lugar, analisa as relações entre senhores e escravizados, tendo em conta as práticas de escravização prevalecentes no território, assim como o perfil dos escravizadores e dos escravizados. Em segundo lugar, busca entender as práticas de alforria e avaliar o impacto e os significados da liberdade, considerando os percursos dos antigos escravizados enquanto pessoas livres no contexto social da África Oriental.

Los conflictos africanos en la cinematografía occidental del siglo XXI: características y consecuencias

Mudimbe (1988) señaló que el conocimiento que el no africano tiene de África sería fruto de una intertextualidad derivada de la literatura, la ciencia y los medios de comunicación. Entre estos últimos, el cine ha representado África desde sus inicios, creando tendencias hasta la actualidad. Una de ellas guarda relación con los conflictos africanos, cuyo comienzo se suele ubicar en 2001 con Black Hawk Down (Scott), sobre el conflicto de Somalia (1993). Estados Unidos es el país con más películas de este tipo, aunque otras cinematografías, sean más o menos comerciales, también se unen a esta tendencia. Este es el caso de la película española El cuaderno de Sara (López Amado, 2018), ambientada en el este de la RD Congo, o la francesa Camille (Lojkine, 2019) ambientada en la República Centroafricana entre 2013 y 2014. Estos son tres ejemplos de las producciones sobre unos conflictos que, utilizando las palabras de Sendín (2012), mediáticamente existen de forma peculiar o no “existen”, pero se utilizan en el entretenimiento cinematográfico.
Esta comunicación, derivada de varios estudios propios más amplios, tiene como objetivo exponer las características generales de la representación de los conflictos africanos en el cine occidental, para otorgarle importancia tras más de veinte años e incidir en que la representación repercute en la acción (y el tipo) o inacción, de la población mundial ante los conflictos africanos presentes y consecuencias como la migración. Es especialmente relevante exponer los resultados respecto a la repercusión para con los negroafricanos, sobre todo, vinculado a la representación de los muertos. Los estudios se han realizado con metodología mixta (Diseño Transformativo Concurrente) y cualitativa. De ambas maneras, la metodología está inspirada en la obra de Said (1978) Orientalismo, trasladada al africanismo y a la perspectiva necropolítica de Mbembe (2016) desde una dimensión audiovisual.

Film expedition and historical sound archives of Africa

The historical recordings from the European colonies of the Berlin Phonogramm-Archiv, for example, were and are a source of inspiration for composers and the archive cooperated with prominent European artists and composers such as Albert Schweitzer and Béla Bartók (e.g. Simon 2000, Kalibani 2024). As can be seen from documents of the Berliner Lautarchiv, cooperations with film companies were also planned during the transition from silent to sound film in order to provide the voices of the “others”, e.g. in travel and expedition films, as authentically as possible with the existing archive holdings (some of which were created in and through colonial contexts). In addition, the archive planned projects which, as a by-product of the film expeditions, envisaged the production of new so-called “Lautplatten” at the expense of the film producers.
Sound recordings in former colonies were also explicitly commissioned by filmmakers for a film, as the example of the British colonial film Men of Two Worlds (1946) shows. For this film, the director commissioned a colonial officer to make music recordings of local groups in what is now Tanzania, which were then sent to England to serve as the basis for the composition of the film music. This can be reconstructed from the reports on the film production.
In this lecture I would like to present the challenges of reconstructing the use of historical sound archives in my newly started research project on the sonic imaginaries of Africa in German film and discuss audiovisual media as archives of colonial heritage and possibilities of decolonization.

Narrando Lisboa: traços afetivos de um arquivo afro-português

As cidades não são apenas um palco estático para as interações sociais, mas acabam por ser continuidamente (re)produzidas a partir das condicionantes históricas, socioculturais, políticas e económicas em voga (Massey 1996). De facto, como argumenta Burgum, a cidade na sua arquitetura e infraestruturas torna-se um arquivo de “contested urban memories, denied histories, and (im)possibilities” (Burgum 2022, 512). No caso da capital portuguesa, a malha urbana encapsula, por um lado, traços da história da expansão ultramarina e do colonialismo, com o Padrão dos Descobrimentos como o símbolo de um passado supostamente glorioso, tornando a ausência até à data de monumentos públicos que testemunhem a violência e opressão do sistema colonial ainda mais marcante. Por outro lado, olhando fora dos marcos turísticos, Lisboa conta as histórias e as memórias da resistência ao colonialismo e à discriminação e racialização que persistem na sociedade portuguesa mesmo na altura das celebrações dos 50 anos da Revolução de 25 de abril.
Partindo das premissas teóricas na interseção de Estudos Urbanos e Estudos Críticos Arquivistas, a presente comunicação pretende estudar obras literárias contemporâneas que retratam a presença e importantemente, a negociação de pertença entre as comunidades lisboetas africanas e afrodescendentes. Ficção, como argumentarei, torna-se uma fonte de arquivo imaginária, usando o conceito introduzido por Gilliland and Caswell (2016) para poder refletir sobre o afeto surgido face às lacunas e os silêncios dos arquivos. Através de uma leitura comparada de Os vivos, o morto e o peixe frito de Ondjaki e Um preto muito português de Telma Tvon, analisarei o imaginário narrativo de Lisboa como um arquivo afro-português que abre o espaço para explorar as questões de afeto, comunidade e direito à cidade no contexto pós-colonial e pós-migratório.

The democratic challenges of leadership succession & re-legitimisation in opposition political parties. The Case of RENAMO in Mozambique

In October 1994, two years after the signing of the General Peace Agreement between the Mozambican National Resistance (RENAMO) guerrillas and the government of the Mozambican Liberation Front (FRELIMO), the demilitarisation of the conflict was achieved through a democratic transition characterised by the recognition of RENAMO as a political party and the holding of the first multi-party elections. The international validation of the founding election results marked the beginning of a new phase of political pluralism and electoral competition in the country. However, in 2013, the two-decade ‘success story’ of peacebuilding and post-war democratisation was thrown into crisis with the resurgence of armed clashes between the former guerrilla and the Mozambican state defence forces under the FRELIMO government. In 2019, after three peace processes and many ups and downs – including the death of the historic guerrilla leader and politician Afonso Dhlakama in 2018 – the FRELIMO and RENAMO political leadership reached the ‘Maputo Peace Accord’, which restored peace in the central region of the country.
This paper aims to contribute to the debate on the role of political opposition in the context of democratic regression in Africa through the case study of the RENAMO party in Mozambique. The objective of the study is threefold: 1) To review the political evolution of the RENAMO party and its contribution to democracy “from the opposition” over two decades of peace and multi-party competition (1994-2013); 2) To analyse the implications of the resurgence of armed conflict and peace processes on RENAMO party and the democratic regression in Mozambique over the last decade (2013-2024); 3) To identify key challenges of the political succession of Afonso Dhlakama to Ossufo Momade in the leadership of RENAMO (2018-2024) for the future of the main opposition political party and the Mozambican democracy.