Refletir sobre o futuro, na sua dimensão ancestral, implica, necessariamente, fazer da Sankofa, simbologia adinkra, um vetor de revisão epistêmica onde inquirir o passado e desvelar os passos que nos conduziram ao presente possibilite um devir de equidade. Logo, o futuro é concebido na sua dimensão de construção coletiva e processual filiado a um legado de lutas por emancipação e dignidade das populações africanas e afrodescendentes inscritas em uma agenda de justiça racial.
Assim, interessa compreender o papel político que a arte africana e afro-brasileira, no contexto da diáspora negra, desempenha no debate sobre emancipação e antirracismo. Destarte, investiga-se o papel que o Festival Mundial das Artes e Culturas Negras desempenhou nos debates sobre essa questão.
Alicerçado nese objetivo, investiga-se a posição de Abdias Nascimento, convocado pela Unesco para participação no Colóquio da Festac 77 com o tema “A significação das Artes Criativas na África e fora da África”. Evidenciando seu importante papel ao alinhavar redes de intelectuais africanos, destacando-se Wande Abimbola e Pio Zimiru em diálogo com artistas e ativistas da diáspora africana alinhavando pautas entre as duas margens do Atlântico Negro na luta antirracista e debate democrático sobre o passado e o futuro dos povos de origem africana.
Esta comunicação objetiva apresentar as relações vivenciadas pelos jongueiros do Vale do Paraíba paulista com os santos padroeiros, especialmente São Benedito e com os seus antepassados no período do Pós-Abolição. São Benedito e seus ancestres eram aclamados e saravados na linha da Kalunga, no Santo Cruzeiro e nas festividades do 13 de maio. Nesse mesmo sentido, outros pontos vitais dessa comunicação, encruzilhados com os percursos históricos e cosmológicos dos jongueiros, são: como foram as pesquisas e registros das rodas de Jongo efetuadas pelas pesquisas folcloristas? Essas pesquisas permitem a reconstituição da historicidade dos trajetos de homens e mulheres negras que vivenciaram as sociabilidades dos Jongos nas cidades do Vale do Paraíba Paulista na primeira metade do século XX? O que se aprende sobre tais sujeitos e trajetórias históricas vinculadas às problemáticas do Pós-Abolição e seus valores? Revelaria, portanto, formas específicas de matrizes centro Africanas para viver e perceber o mundo? Estes são os pontos lançados que conduzirão as inquietações dessa comunicação, visando, se não os desatar em sua totalidade, seguir as pistas, enigmas e mistérios das artes da ngoma.
Quilombo refere-se a um espaço de resistência, ocupado por pessoas que fugiram da escravização e se reuniram em inúmeras comunidades espalhadas pelo vasto território brasileiro. Hoje, os quilombos são verdadeiros locais de valorização da cultura africana e afro-brasileira. Esta comunicação tem, portanto, o objetivo de apresentar o canto, a dança e a festa como ritualidade do Quilombo do Curiaú, localizado a oito quilômetros da cidade de Macapá, a capital do Amapá, no extremo norte do Brasil, onde 489 famílias, lideradas por mulheres, celebram a memória e a história dos seus antepassados africanos por meio do marabaixo, uma manifestação cultural de origem africana típica de comunidades afrodescendentes amazônidas, que inclui dança de roda, canto e percussão ligados às festas do catolicismo popular em louvor aos santos padroeiros.
Não há colonialismo que prescinda do exercício da violência. No colonialismo, a violência não é circunstancial, episódica, ela é essencial, sistêmica, racial, como bem apontou o filósofo e psiquiatra martinicano Frantz Fanon. Diante desse contexto, inúmeros escritores de terras colonizadas, em particular da África, interpretaram o sistema e trataram as sequelas desse processo de dominação em suas sociedades. Propomos, assim, uma análise e leitura interpretativa do tema a partir dos textos literários “O último pesadelo”, da escritora moçambicana Lília Momplé, presente no livro Ninguém matou Suhura, e “A fronteira de asfalto”, um dos que compõem o livro A cidade e a infância, do escritor angolano José Luandino Vieira, considerando o contexto histórico e social ao qual se inserem as obras, bem como a construção simbólica de suas principais personagens. Os cenários temporais dessas narrativas abarcam justamente o período histórico de segunda metade do século XX (precisamente entre os anos de 1950 e 1974), o qual circula um imaginário imperialista português pautado na homogeneidade territorial anacrônica, ao mesmo tempo que se desenvolve a luta nacionalista pela independência das suas antigas colônias africanas. Para tal, contaremos com as contribuições teórico-críticas de autores como Frantz Fanon, Aimé Césaire e Grada Kilomba. Ao expor questões colonialistas com tamanha criticidade, denunciando a violência e brutalidade dos confrontos pela emancipação nacional, através da literatura, Lília Momplé e José Luandino Vieira constroem um discurso narrativo que mantém fortes vínculos com a História, fazendo com que a literatura reflita dignamente aos conflitos e tensões políticas vividas por esses povos, assim como mobilizam as memórias sociais que oscilam entre passado e presente. Nesse sentido, os textos se mantêm bastante atuais no que tange à análise do que foi o contexto colonial e de como a repressão e violência coloniais foram exercidas desde então.
A arte literária produzida por mulheres afrodiaspóricas, como Conceição Evaristo e Chimamanda Ngozi Adichie, atravessa os campos da cultura e da memória ancestral africana, evidenciando a complexidade da experiência negra no mundo. Embora situadas em diferentes contextos geográficos, suas obras se entrecruzam na partilha de lutas e resistências comuns. Dessa forma, estudo analisa os diálogos entre os contos Mary Benedita, de Conceição Evaristo (2016), e A Historiadora Obstinada, de Chimamanda Ngozi Adichie (2017), sob a perspectiva da interseccionalidade e da escrevivência, visando destacar como a escrita de mulheres negras se constitui como uma ferramenta de resistência, afirmação identitária e união de vozes femininas. Em ambos os contos, a interseccionalidade e a escrevivência são fios condutores que se sobrepõem às personagens principais, revelando as diferentes formas de opressão que atravessam suas vivências, raça, gênero, classe e outras identidades sociais, que configuram a marginalização das mulheres negras. No contexto da realidade brasileira, Evaristo retrata o cotidiano das mulheres periféricas, enquanto Adichie lança um olhar para a diáspora africana e o impacto do colonialismo. Dessa forma, as autoras exploram as múltiplas camadas da identidade e da opressão, utilizando a escrita literária para forjar novas possibilidades de resistência. Para fundamentar a análise, utilizam-se os pressupostos teóricos de autoras que criticamente abordam a interseccionalidade, como Carla Akotirene (2020) e Kimberlé W. Crenshaw (2002), além de pensadoras do feminismo negro, como Patricia Hill Collins (2019), Angela Davis (2016) e bell hooks (2019). Também são considerados teóricos que discutem o devir-negro no mundo, como Achille Mbembe (2018), os estudos culturais de Homi K. Bhabha (2020), o pensamento anticolonial de Aimé Césaire (2008), os estudos da memória coletiva de Maurice Hallbawachs (2003) e a interpretação psicanalítica da questão racial, conforme proposta por Frantz Fanon (2020).