Os desígnios políticos versus as facetas culturais em São Tomé e Príncipe

Augusto Nascimento

Ao cabo de um processo conducente à independência sem luta, no arquipélago equatorial não ocorreu uma grande aposta na cultura enquanto elemento de afirmação nacional. Frequentemente se disse que a resistência tinha sido, sobretudo, cultural, mas esta afirmação prevaleceu mais pela posição política de quem a enunciava do que pela valia interpretativa do significado político dos artefactos culturais são-tomenses, supostamente distintos dos portugueses.
Após a independência, a vertente cultural importaria menos no cotidiano individual e coletivo dos são-tomenses. Sob o regime de partido único, não havia mobilização de referentes culturais para a arena política. Por fim, não existia uma atividade académica e o registo dos artefactos culturais era amador, sem um fundo de reflexão acerca da valia de artefactos culturais para aquilo que seria uma identidade cultural partilhável pelos ilhéus. Tratando-se de uma ilha, modos de vida, hábitos, crenças estavam mais ou menos ao abrigo de influências estranhas, mormente das do continente africano. Embora presentes, tais influências não eram prezadas. A afinidade com a África era lembrada, mas sem grande insistência, trocada pela obsessão de criar um “homem novo”.
Os construtos culturais, que indicavam especificidade dos são-tomenses – caso, por exemplo, do djambi – e com os quais os dirigentes políticos contemporizavam sem, contudo, conseguir disfarçar algum incómodo, eram interpretados, quando neles assomavam facetas de crendice retrógrada, como estando relacionados com estágio de “desenvolvimento das forças produtivas”. No tocante à cultura mais erudita praticamente se vedou a criação literária que, a existir, deveria ser orientada para a exaltação das metas políticas, pelas quais se concretizava a emancipação do povo.
O credo revolucionário rezava que tudo era político, o que, ao invés de valorizar os sentidos políticos das manifestações culturais, as atrofiava e as condicionava à exaltação da vontade do chefe.